A Alpinista

“Junto ao rio, bem no alto do granito, como um fantasma verde e solitário, um velho 
juazeiro centenário está sempre a apontar para o  infinito”. 
Nonato Merques 
Excerto do soneto “O Juazeiro da Pedra” 




Nossa casa, o Chalé, ficava próxima ao rio Itapicuru, que avançava, sem pressa, polindo seixos e lajedos, em busca de seu destino, o mar. 
À sua margem direita avulta, em porte e beleza, um lajedo peculiar. 
Alto e imponente, acolheu em seu topo um verdejante juazeiro que o enlaçou com vigorosas raízes, entranhando-as em suas fendas. Por essas singularidades, ficou conhecido como “juazeiro da pedra”. 
Fascinada com sua beleza e altitude, cerca de 4 m, Dete, minha irmã, jurou escalá-la. Alcançar seu topo seria a glória suprema. Imaginava-se bafejada pela brisa ribeirinha saboreando, nas alturas, um doce juá! 
Era uma tentação, um desafio a ser vencido. Planejava-o às ocultas, aguardando o momento propício. 
Nossos pais não permitiam que fôssemos sozinhos ao rio receosos de acidentes. 
Dete, que dos irmãos, era a mais destemida, traquina e aventureira, desobedeceu a regra. 
O momento propício surgiu. Um descuido dos adultos e, com uma amiguinha, tão peralta quanto ela, sorrateiramente, tomaram o rumo da pedra, eis que estavam resolvidas a “escalá-la”. Tentaram fazê-lo. 
Dete, que liderava a expedição, ordenou que a “auxiliar”, Pedrina, estendesse as mãos para servir-lhe de apoio e, sobre este, pôs um dos pés. 
 “Foi tiro e queda”. Logo se ouviu um baque surdo, seguido de gritos de dor. Estatelaram-se no chão recoberto de capim, pedregulhos e areia grossa. 
Feriram-se, machucaram-se e não alcançaram o pico do “Everest”. A amiguinha, Pedrina, sofreu arranhões. Dete feriu-se, ensanguen- tou-se. 
Um aguadeiro carregou-a nos braços e levou-a a nossa casa. Meus pais ficaram preocupados até verificarem que os ferimentos eram super- ficiais. 
Dete tinha noção e medo da morte. Em seu choro convulsivo e angustiado, perguntava reiteradas vezes a uma amiga e vizinha: “D. Maricas, eu vou morrer?” Ela respondia: “não minha filha”, vai ficar boa. 
Mesmo assim e apesar dos rogos da boa vizinha, após o banho de água com sal e feito os curativos, levaram palmadas de Mamãe. 
Não morreu, mas nunca mais se aventurou a galgar “montanhas”. 
Se tivesse alcançado o topo, mereceria um troféu: coroa de folhas de juazeiro com seus frutos dourados! 
(14/10/05) 


________________


Foto 35. O juazeiro da pedra (por este autor).

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas