Alfazema
Era 29 de março de 1935, morávamos no Chalé, uma mansão às margens do rio Itapicuru, emoldurada pelo verde dos vegetais, o colorido de flores de variadas espécies, em meio a um belo bosque onde se aninhavam pássaros que lhe davam mais vida e beleza com suas cores, seus movimentos e trinados.
Acordei com o odor suave da alfazema impregnando o ambiente.
Era o anúncio do nascimento de mais um irmão. Assim fora com as que vieram depois de mim e assim deve ter sido comigo e com os que me precederam. Era costume da família, ou quem sabe, um dado da cultura regional.
Passado o primeiro momento, acurei o ouvido e, por entre o gorjeio dos pássaros, escutei um vagido.
Não errara!
Curioso, fui até a porta do quarto de minha Mãe onde permaneci em silêncio, desconfiado.
A pouca luz de um candeeiro misturava-se com o escuro e dava ao quarto o tom de meia-luz, de penumbra. A janela permanecia fechada, mas, por diminutas frestas, filetes da luz solar infiltravam-se pelo quarto onde estavam a parteira e pessoas da família.
Minha Mãe estava no leito deitada, tendo nos braços um pequenino ser, envolto em panos brancos.
Era a irmã caçula que acabara de nascer. Recebeu o nome de Terezinha, em homenagem à Santa da qual minha mãe era devota.
Ao ver-me, minha Mãe sinalizou para que me aproximasse. Assim o fiz, pé ante pé, temeroso em perturbar o sono da irmãzinha.
Cheguei à borda da cama, fiquei na ponta dos pés, espichei-me e a vi: era pequenina, vermelhinha, cabelos pretos, olhos fechados, mãos e pés envoltos em diminutas camisolas. Aconchegada nos braços de Mamãe ela dormia e parecia sonhar, pois, de quando em vez, seus lábios esboçavam um sorriso!
Fiquei algum tempo nessa posição, extasiado, até ceder espaço aos irmãos que, um a um, começaram a aparecer.
Éramos cinco e todos queriam vê-la e tocá-la carinhosamente. Expressavam no olhar amor, ternura e curiosidade. A pequenina mantinha-se impassível, indiferente, olhos fechados. Às vezes fazia leves movimentos nos lábios, como se estivesse esboçando um sorriso.
Mamãe estava feliz, era a sexta filha.
A chegada de mais uma irmãzinha não foi surpresa. Em casa dizia-se que iríamos “ganhar um irmão”, sem maiores esclarecimentos. Nem sequer se falava na história da cegonha! Ignorávamos os mistérios da concepção e do nascimento.
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Imagem 37: Fotografia da Lavanda (ou Alfazema). Fonte: internet.
Imagem 38: Fotografia de minha irmã caçula Terezinha. Acervo da família.
Imagem 37: Fotografia da Lavanda (ou Alfazema). Fonte: internet.
Imagem 38: Fotografia de minha irmã caçula Terezinha. Acervo da família.
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